Fundamentação Teórica

Índice

Considerando a escassez de materiais relacionados ao tema desta pesquisa, principalmente na área de Gestão da Informação, se faz necessário buscar novas referências de modo exploratório buscando um melhor entendimento do conjunto de conhecimento acerca das criptomoedas em outras áreas de conhecimento, de maneira a aplicar conceitos econômicos para tomadas de decisão.

Segundo Aranha Filho (1995), os movimentos migratórios das massas para o mundo digital promoveram diversos impasses sociais que já existiam no mundo físico e foram transferidos para o meio digital. Segundo o autor, ainda naquela época, os provedores de serviços de rede e empresas interessadas em fazer negócio em âmbito digital travavam um verdadeiro duelo por território e delimitações de “fronteiras”.

Esse duelo gerou uma “revolução” onde grandes comunidades delimitadas por assuntos específicos foram criadas e mesmo boa parte das pessoas dessas comunidades sendo de países diferentes, a distância não impediu a interação dessas comunidades virtuais e a frequência com que trocavam informação e experiências. De acordo com Silvestri (1993) apud Castells (2005, ed. 8, p. 69), “o que caracteriza a atual revolução tecnológica não é a centralidade de conhecimentos e informações, mas a aplicação desses conhecimentos para a geração de conhecimentos [...] em um ciclo de realimentação cumulativo entre a inovação e seu uso”.

Assim como as comunidades virtuais cresciam, a necessidades de executar tarefas do mundo real em ambiente digital também crescia, e um dos primeiros indícios do que se tornaria a internet foi a popularização do comércio eletrônico, que mesmo sofrendo com fraudes e ataques de hackers constantemente segue uma tendência crescente de adeptos desde o início do século XXI. Era necessário então, um novo paradigma de transações que fosse confiável para as duas partes. Para Nakamoto (2008, tradução nossa),

“o comércio na Internet tornou-se quase que exclusivamente constituído por instituições financeiras servindo como intermediários confiáveis para processar pagamentos eletrônicos. Enquanto o sistema funciona bem o suficiente para a maioria das transações, ele sofre da fraqueza inerente do modelo baseado em confiança (NAKAMOTO, 2008)”.

Em seguida, o autor justifica a fragilidade do atual sistema de pagamento, pontuando que nesse sistema, por haver intermediários é necessário a existência de taxas de mediação, elevando os custos de cada transação, assim como acontece em compras com cartão de crédito e débito, e possibilitando que a transação seja interceptada e fraudada ou revertida. Já num sistema de pagamento ponto-a-ponto, Bitcoin, as mesmas transações seriam computacionalmente impraticáveis, diminuindo os riscos de fraude e tornando muito mais rápidas as negociações digitais (NAKAMOTO, 2008).

O Bitcoin foi definido por Nakamoto (2008) como a “versão puramente ponto-a-ponto de dinheiro eletrônico”, ou seja, uma alternativa para o atual sistema monetário com o atrativo de não necessitar de nenhuma entidade centralizadora para validar suas transações. Isso é viável por causa da base técnica do Bitcoin, que em vez de transações baseadas em confiança (protocolos e ambientes seguros) necessita de provas criptográficas para que as duas partes negociadoras possam realizar uma transação diretamente sem uma terceira parte confiável intermediando a negociação.

A rede ponto-a-ponto que mencionou Nakamoto é uma estrutura onde cada usuário (um ponto da rede) se comunica/transaciona diretamente com outro usuário, sem a necessidade de intermediários. Esta estrutura foi pensada para que os usuários da rede enviem e recebam dados, isto é, mensagens, transações e arquivos com segurança. Essa arquitetura é utilizada em aplicativos que prezam pela privacidade de dados, como por exemplo o aplicativo de mensagens instantâneas Whatsapp, onde as mensagens são criptografadas ponto-a-ponto.

Para que a rede Bitcoin funcione normalmente, é necessário que hajam regras para as transações, como por exemplo, cada bloco da rede tem validade, assim como as transações, isto evita que transações já processadas sejam duplicadas. Há também outras regras, que dizem respeito à prioridade das transações, que pode ser alterada diretamente pelo usuário ao efetuar uma transação. Quanto maior a prioridade, maior a “taxa” paga aos mineradores da moeda, isto é, quando um usuário efetua a transação, para que a quantidade correta de moedas chegue na carteira correta, é necessário que os mineradores realizem os cálculos específicos de criptografia. Esta taxa é diretamente proporcional à quantidade de transações na “fila de espera” da rede. A taxa também ocorre para que mais bitcoins sejam gerados na rede, pois, a cada período de tempo, a rede Bitcoin recompensa proporcionalmente os mineradores pelo seu trabalho. Estas regras existem para garantir a manutenção da blockchain, o banco de dados descentralizado da rede Bitcoin.

A tradução literal da palavra blockchain é “corrente de dados”, e sua aplicação prática é algo semelhante a isso. Segundo Oliveira Filho (2016), trata-se de uma estrutura de dados pública para os usuários da rede, que armazena, em blocos, todas as transações que já ocorreram. Uma transação só é considerada válida se estiver na blockchain. A segurança e solidez do Bitcoin baseia-se nesse conceito de validação na blockchain além das propriedades da proof of work, isto é, da prova de trabalho utilizada na mineração de bitcoins. Cada transação é um "bloco" dentro da blockchain, que registra a data e hora da transação e após isso propaga o registro para a rede, inviabilizando fraudes (ULRICH, 2014).

Por ser um ativo ainda novo no mercado, o seu preço sofre constantes oscilações, e por ter várias moedas que se originaram no seu código-fonte, o Bitcoin, é frequentemente utilizado como parâmetro para generalizar o ecossistema das criptomoedas.

O preço do Bitcoin é fruto da sua oferta e demanda, e como tem passado por sucessivas valorizações, tornou-se um ativo financeiro que tem despertado investidores pelo mundo todo. Ulrich (2014) nos explica a lógica inflacionária do preço do Bitcoin da seguinte forma),

a oferta crescerá de forma paulatina, pré-estabelecida e conhecida por todos os usuários até alcançar o limite máximo de 21 milhões de unidades ao redor do ano de 2140 [...] Assumindo que a demanda por bitcoins continue crescendo ao longo dos próximos anos, isso significaria que uma unidade bitcoin valeria cada vez mais. E quanto mais se amplie a aceitação da moeda, maior será seu poder de compra (ULRICH, 2014).

Segundo Campbell et al. (1997), a utilidade do estudo de eventos está atrelada ao fato de que, dada um determinado contexto dentro do mercado, o efeito de um evento, será refletido imediatamente nos preços dos ativos. O autor observou que o impacto econômico do evento pode ser mensurado utilizando os preços dos ativos observados durante um curto período de tempo, isto é, a reação instantânea do mercado após a disseminação deste evento. Dado isso, estes mesmo autores estabeleceram sete passos para delinear o estudo de um evento, são eles:​

  1. Definição do evento: É o passo inicial, definição do evento e do período onde os preços serão analisados.

  2. Seleção de critérios: Após definir o evento, é necessário definir os critérios de avaliação, como por exemplo o mercado, abordar apenas eventos de uma determinada fonte, etc.

  3. Retornos normais e anormais: Para avaliar, precisamos mensurar. Nesta etapa metrificamos os impactos dos eventos e mensuramos seus retornos, determinando se são normais ou anormais.

  4. Procedimento de estimativa: Nesta etapa selecionamos um modelo de desempenho, após isso, os parâmetros do modelo devem ser estimados usando a janela de estimativa.

  5. Procedimento de Teste: Com o parâmetro de desempenho estabelecido na etapa passada, é necessário avançar ao teste dos retornos anormais.

  6. Resultados empíricos: Nesta etapa ocorre a apresentação dos resultados, pautando-se na estrutura tradicional do design econométrico.

  7. Interpretação e conclusões: Os resultados apresentados devem nos levar à interpretações teóricas acerca de como os eventos podem afetar os preços de ações.

A escolha por esta abordagem pauta-se na estrutura teórica desenvolvida em torno desta linha de pensamento, que advém desde o final da década de 60, desenvolvido por Eugene Fama, Lawrence Fisher, Michael Jensen e Richard Roll. Segundo o estudo destes autores, foi possível identificar que sucessivas variações de preços aconteciam por interferências informacionais externas (Fama et al., 1969).

Rostagno et al. (2002) sugere que o estudo de eventos trata-se de uma metodologia analítica para metrificar a influência que determinado evento sobre a performance de uma empresa através da investigação dos efeitos de tais eventos nos valores de mercado dos títulos das empresas. Binder (1998) apud Silveira (2006) aponta que o estudo de eventos tem sido utilizado na prática para dois objetivos principais:

  1. Testar a hipótese nula de que o mercado eficientemente incorpora informações;

  2. Examinar o impacto de um determinado evento na riqueza dos acionistas de uma determinada empresa, mantendo a hipótese de mercado eficiente referente à informação pública.

Portanto, ao inferir que o mercado financeiro convencional incorpora, de fato, informações, faz-se necessário averiguar até que ponto estas informações de notícias e eventos têm o mesmo efeito no mercado de criptomoedas. Num mercado amplamente globalizado como o de criptomoedas, identificar fatores que possam influenciar no preço dos ativos é, sem dúvidas, uma vantagem estratégica, pois, conforme veremos adiante, o preço do Bitcoin oscila de forma "imprevisível" à primeira vista, porém, é possível prever certos movimentos com o estudo de tendências e o mapeamento da sua especulação.

Dentro do contexto brasileiro, o estudo de eventos já foi utilizado para diversas abordagens, desde uma análise empírica do impacto da adesão aos níveis diferenciados de governança corporativa da Bovespa (COSTA e CAMARGOS, 2006), até um estudo de precificação das ações da Petrobrás durante o caso Pasadena (LEITE, WILBERT e SERRANO, 2016).

Buscando contextualizar o processo especulativo no preço do Bitcoin, é preciso conceituar os Fluxos Informacionais, para então avançar para o fluxo especulativo. Cientes da existência de diversas definições de Fluxos Informacionais dentro da Ciência da Informação, iremos utilizar a definição de Savi et al. (2009, p. 178), de que um Fluxo Informacional é um processo “transferência da informação de um emissor para um receptor”. Um Fluxo Informacional geralmente é mapeado para identificar carências ou problemas na execução de processos.

Identificar fluxos informacionais é papel do Gestor da informação, que cada vez mais, vem sendo percebido como profissional diferenciado no mercado atuando no âmbito estratégico nas organizações. Essa tendência se tornou uma realidade por conta dos benefícios que um bom planejamento pode ter. Gerir a informação é visualizar a organização de forma holística, com apoio de fluxos informacionais é possível identificar tendências e adotar estratégias para contornar possíveis obstáculos. Corroborando com isto, McGee E Prusak (1994, p.5) afirmam que “a criação, captação, organização, distribuição, interpretação e comercialização da informação são processos essenciais para organizações preocupadas com a GI”.

Ou seja, cabe à Gestão da Informação identificar este fluxo de informação, e interpretá-lo da melhor forma para então comercializar a informação de maneira eficiente. Este papel interpretativo que a Gestão da Informação exerce corrobora com a visão de Castells (2001) que abordou Fluxos de Informação e os definiu como “seqüências intencionais, repetitivas e programáveis de intercâmbio e interação entre posições fisicamente desarticuladas, mantidas por atores sociais nas estruturas econômica, política e simbólica da sociedade.” Essa interação contínua mencionada por Castells acontece no mercado de criptomoedas constantemente, por interesse dos detentores de maior quantidade de moedas, com a finalidade de obter um lucro maior.

Este processo contínuo de interações entre os detentores de moeda acaba criando dentro do ambiente das criptomoedas algo similar à uma bolha especulativa, que pode ser definido como um aumento persistente no preço, que não é acompanhado pelo valor agregado do ativo. que é sucedida por uma queda brusca nos preços (KING, 1993). Assim como pontuou Castells à respeito dos fluxos, as bolhas especulativas também são sequências repetitivas e intencionais, com características parecidas, foi assim na Mania da Tulipa (1624-1637), na bolha do Mississipi (1716-1720) etc.

O Bitcoin pode ser caracterizado como bolha especulativa, pois, segundo Ulrich (2014), o Bitcoin passou por pelo menos 5 ajustes de preços consideráveis em 2011, ocasionados por pressão constante da imprensa e pressão de novos investidores interessados em lucro rápido. Ulrich ainda explica como ocorre esta pressão, que conta com a adesão da notícia pelos investidores e o desejo por tirar vantagem dessa notícia.

Há também o adendo que as moedas digitais se auto valorizam, sem necessariamente precisar entregar valor. Segundo Costa (2017), “quanto mais bitcoins adquirem os especuladores, mais valioso se torna a moeda digital para cada proprietário”, isso acontece por causa do limite técnico de moedas na rede (21 milhões) e pela valorização instantânea causada pela escassez da moeda, que ao ser comprada por um investidor, ele passa a concentrar mais moedas e tornar o ecossistema mais “desigual”. Costa ainda fala que o Bitcoin é uma nova forma, para o velho processo especulativo do mercado financeiro, argumentando que qualquer um “pode comprar uma criptomoeda sem a intenção de criar valor para os outros utilizadores dela, mas acaba por fazê-lo. [...] Logo, as moedas virtuais alcançam maiores cotações quanto mais compradores aderirem.

O processo de tomada de decisão é uma construção cognitiva baseada nas experiências tácitas de cada indivíduo, no ambiente dos investimentos financeiros não é diferente. Assaf Neto (1997) afirma que “estas decisões são tomadas pelas empresas de forma contínua e inevitável. As decisões de investimento envolvem todo o processo de identificação, avaliação e seleção das alternativas de aplicações de recursos, conforme identificadas nos Ativos”.

O processo decisório nos dias atuais está muito mais dinâmico por causa da rapidez com que obtemos informações atualmente. Portanto, aquele que for o detentor de informações mais privilegiadas ou com melhor uso estratégico estará em uma posição à frente dos demais investidores. Wernke (2008) apud Dias (2015) acredita que “informar-se permite ao gestor ou investidor ter melhores condições para decidir sobre a aplicação no mercado [...]”, pois segundo o autor, é possível relacionar as informações disponíveis para o investimento e traçar um planejamento de acordo com o perfil do investidor.

É crucial para qualquer fluxo decisório que este seja planejado e tenha suas metas bem definidas, caso contrário, os riscos são exponencialmente maiores, afinal, as decisões de investimento devem promover um retorno (geração) de caixa compatível com o fluxo de desembolsos demandado pelas fontes financiadoras (ASSAF NETO, 1997). Afinal, ainda faltam veículos confiáveis para viabilizar a procura por informação do investidor informal, seja com o objetivo de acumular riqueza ou de multiplicação de quantidade de moedas. Baseando-se nisso, para embasar as decisões tomadas nesta pesquisa, foram utilizadas fontes confiáveis, e cada decisão será analisada baseando-se no histórico do preço, volume de negociações e preço do dólar.

Outro ponto para se levar em consideração ao tomar uma decisão importante é seu risco. No contexto do mercado do Bitcoin, o risco é uma variável que deve ser analisada sempre, pois, as desvalorizações dependendo de moeda para moeda podem atingir 25% no dia seguinte (GUIMARÃES, 2017). Cada investidor necessita estudar por si só e aplicar quantias que realmente não irão lhe fazer falta.

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